Rogério Fernandes Ferreira
As actividades que exerço desenvolvem-se particularmente em áreas de Gestão, Contabilidade, Fiscalidade. Acontece que nos tempos mais recentes o tema da Ética vem sendo também objecto de estudos e apreciações entre profissionais daquelas matérias. Assim também sou frequentemente solicitado para incursões em estudos de articulação entre Ética e Gestão/Contabilidade.
Sem teorizar nem conceptualizar matérias de Ética, que estão fora das minhas áreas de conhecimento e onde não pretendo ser paladino, admito, contudo, haver utilidade em cotejar aspectos éticos com práticas profissionais.
Começa-se por aludir que enquanto na Economia e na Gestão se fazem cômputos quantitativos (PIB, inflação, desemprego, custos, proveitos, resultados, riqueza, etc.), na Ética os valores que se procuram são de outra natureza, são de ordem qualitativa.
A Ética, aliás como a Saúde ou a Felicidade, são realidades sentidas, e não propriamente realidades quantificáveis. Haverá estatísticas relativas a Ética, mas elas respeitam à sua falta, a seus aspectos negativos (v.g., índices de incumprimento de contratos, cheques sem provisão e outros actos lesivos). Também em termos de Saúde, as estatísticas são de “não Saúde”, por exemplo, revelam-se em baixas no trabalho, doenças, hospitalizações, etc. Também as estatísticas de “não felicidade” deduzem-se de índices, como os de desemprego, suicídio, rendimento, habitação, etc.
A Ética acaba a apreciar-se em fronteiras, entre legal e ilegal, lícito e ilícito, justo e injusto. As considerações de ordem ética manifestam-se com muita peculiaridade.
Facetas de ético e de não ético visualizam-se adequadamente através de alegorias e paradigmas. Concebemos as seguintes:
“Se a solução que favorece é legal, mas injusta, eticamente põe-se em causa a opção legal – por ser injusta e trair a consciência;
Se a solução que favorece é justa mas é ilegal, eticamente põe-se em causa a solução justa – porque é ilegal e não há que desrespeitar a lei”.
Examinar um dever ético vem a cair em apreciações do íntimo de cada um, análises da nossa conduta perante os outros, o que extravasa das regras da moral comum. Se as opções assumidas nos trazem benefícios, ainda que com respeito pela lei, importa, ainda assim, ponderar da sua justiça para com terceiros.
A Ética impõe constrangimentos, renúncia ao que nos pode injustamente trazer vantagens.
A conduta ética pressupõe generosidade; não é conduta hipócrita, para agradar, enganosamente.
Do que se aponta poderá deduzir-se que a Ética suscita juízos de consciência profundos que pressupõem:
● a não violentação de outrem;
● não tornar os outros infelizes ou injustiçados;
● abdicar do que não for justo e correcto. Passando de plano geral para o da prestação de contas, observa-se que quem elabora, aprecia ou audita contas de empresas e demais instituições está sujeito à formulação de juízos em que se testam condutas.
Na gestão pretende-se maximizar vendas, lucros e outros objectivos. Os gestores, ao procurarem mais vendas e resultados, devem questionar-se: Comprar ainda mais barato? Pagar mais baixos salários? Vender mais caro, alterar margem de lucro? Vender gato por lebre ou lebre por gato? Até onde?
Há empresas a falsear declarações, contas, produtos. Suponha-se que se prevê, com forte probabilidade, que o falseamento não virá a ser conhecido? Deve medir-se esse risco de falseamento, ver se é mínima a probabilidade de descoberta?
Sabe-se que em profissão antiga – a de médico – é dever salvar o doente (custe o que custar). A eutanásia é (ainda!) crime.
Um gestor deve salvar a empresa, custe o que custar? À custa de quê ou de quem?
Nas empresas, em caso de escassez de recursos financeiros deve pagar-se primeiro a quem? Aos gestores e mais directos colaboradores, em detrimento dos demais?
Aos trabalhadores em detrimento dos outros credores? A uns fornecedores e não a outros? A certos sócios? O Fisco fica para o fim? Falsear dados para sobreviver?
Estarão a ocorrer deteriorações nos comportamentos de cada um? É a sociedade actual que corrompe os cidadãos? Ou são os cidadãos, com menosprezo da ética, que corrompem a sociedade? Quem é responsável?Perante difíceis interrogações ser ético, virtuoso, é mesmo ético, virtuoso, sublime. Ou impossível?
Rogério Fernandes Ferreira, Professor jubilado do ISEG/Gestão
http://diarioeconomico.sapo.pt/edicion/diarioeconomico/opinion/columnistas/pt/desarrollo/714783.html
Comentário
http://diarioeconomico.sapo.pt/edicion/diarioeconomico/opinion/columnistas/pt/desarrollo/714783.html
Comentário
O artigo do Professor Rogério Fernandes Ferreira, pareceu-me interessante, na medida em que relaciona Ética com Gestão/Contabilidade.
Antes de mais parece-me relevante levantar a terrível questão, o que é a ética? Ética (tem origem directa do latim ethica e indirecta do grego ηθική, ethiké) é um ramo da filosofia, e um sub-ramo da axiologia, que estuda a natureza do que é considerado adequado e moralmente correcto. Pode-se afirmar também que Ética é, portanto, uma Doutrina Filosófica que tem por objecto a Moral no tempo e no espaço, sendo o estudo dos juízos de apreciação referentes à conduta humana.
Embora saibamos que a ética deve estar presente em todas as áreas quer familiares, profissionais, politicas, …, por vezes, se reflectirmos sobre os nossos actos, iremos concluir que nem todos são éticos, porque pronunciar a palavra ética, é muito fácil, mas um facto é que não é fácil cotejar aspectos éticos com práticas profissionais.
O Professor Rogério Fernandes Ferreira, diz que “enquanto na Economia e na Gestão se fazem cômputos quantitativos (PIB, inflação, desemprego, custos, proveitos, resultados, riqueza, etc.), na Ética os valores que se procuram são de outra natureza, são de ordem qualitativa”. E talvez seja dai que vem a dificuldade em se agir eticamente, porque os gestores procuram maximizar vendas e lucros e por vezes para atingiram os seus objectivos há empresas que não agem eticamente, para se agir com ética não importa só o respeito pela lei mas também a justiça para com terceiros, é ai que reside a dificuldade de se agir eticamente porque o dever ético depende de apreciações do íntimo de cada um e da análises da nossa conduta perante os outros, o que extravasa das regras da moral comum. Ético é aquele que é considerado bom, e, todos nós sabemos que: o que é bom para a leoa, não pode ser bom à gazela. E, o que é bom à gazela, fatalmente não será bom à leoa. Este é um dilema ético típico.
E nos dias de hoje cada vez se torna mais difícil agir correctamente porque a luta pela sobrevivência no mercado de trabalho é cada vez maior e por vezes são esquecidos valores morais, o que é fatal porque a ética é um julgamento de carácter moral de uma determinada pessoa.
3 comentários:
Este artigo aborda esta questão de uma forma muito realista, questionando mesmo a “ética”.
A presença constante e do tema da ética nos discursos empresarial e académico, tem convivido com um aceso debate sobre os padrões que devem nortear os negócios.
A questão central é a de saber se a actividade empresarial deve, ou não, reger-se pelos mesmos valores e padrões éticos de outras actividades da vida social. Há quem defenda que o nível de competição presente no mundo dos negócios, não tem comparação com a que se verifica noutras actividades.
Considerando a ética como a moral profissional, teremos de ter algum cuidado ao transferi-la para a actividade empresarial, uma vez que existe sempre a tendência de analisá-la pelos padrões da ética da vida privada, onde atitudes consideradas moralmente inaceitáveis como a mentira ou a omissão de factos, tornam-se aceitáveis no contexto empresarial, uma vez que fazem parte das regras do jogo no mundo dos negócios.
Nesta actividade a mentira deixa de ser mentira quando todas as partes sabem que não se espera que a verdade seja dita.
De vez em quando, os executivos são forçados, em prol dos interesses das empresas ou deles próprios, a praticar alguma forma de mentira. Através de deturpações da verdade, da ocultação de factos pertinentes ou do exagero, eles tentam persuadir os outros a concordarem com eles. Esta actuação é aceitável, pois o executivo que recusa fazer bluff de vez em quando está a ignorar oportunidades permitidas pelas regras do jogo e fica em desvantagem.
Não se pode contudo, correr o risco de se pensar que a maior parte dos executivos e empresários seja indiferente à ética nas suas vidas privadas, mas na vida profissional, eles são jogadores que devem guiar-se por padrões éticos diferentes. Considera-se que, desde que obedeçam à lei, os gestores estão no direito de actuar nos negócios como entenderem, preferencialmente de forma agressiva de modo a não se ser atingido pela concorrência.
Para ser um vencedor um gestor tem de jogar para ganhar, mas qual será a melhor táctica a utilizar.
É necessário ser cruel nos negócios?
E deve-se agir de forma severa?
Ser e comportar-se de modo traiçoeiro compensará?
Aqui começam os dilemas éticos. Até onde se pode ir é a grande questão, pois na realidade as coisas são muito diferentes daquilo que vem nos livros, ou seja, valores como a honestidade ou a integridade é que fazem a reputação e levam á vitória final. A realidade do dia a dia de um gestor contempla, responsabilidades com ordenados no fim do mês, obrigações fiscais a cumprir, fornecedores a aguardarem pagamentos ou (cada vez mais presente) problemas com as cobranças a clientes. O problema é que esta realidade, na maioria das vezes não “dá tempo” para se ser eticamente correcto, as intenções podem ser muito boas, mas não pagam as letras no seu vencimento.
Em dificuldades de tesouraria, um negócio é para se fazer de qualquer forma, pois daí depende a sobrevivência da empresa, e nessas alturas a ética ou fica na gaveta da secretária ou prevalece, e aí, é o mesmo que comprar um bilhete para a ópera, e deixar um filho com fome.
António Revez, nº4679
Ética, Conduta, Moral, Legalidade, Licitude, Gestão… parece que estamos aqui a falar de tudo o que temos vindo a referir ao longo deste último semestre na nossa disciplina de Ética Empresarial. O que poderia interessar mais do que este tema no Blog que foi dedicado a esta unidade curricular? Só se aqui viermos introduzir também o conceito de Deontologia. E porque não?
Aproveitando também o trabalho que realizámos sobre este tema, sinto-me agora capaz de pronunciar um conceito para o termo “Deontologia”: A Deontologia abraça Ética e Moralidade e fixa os deveres e responsabilidade requeridos por determinado ambiente profissional. Se esta pode ser uma simples definição do termo de deontologia, então nada se poderia aqui encaixar melhor. Afinal podemos falar de Ética e relacionar esta definição com o termo “Deontologia” pois estes dois termos encontram-se intimamente ligados.
Mas porquê começar por definir os dois termos? Simplesmente para poder relacionar o que este post quer transparecer com códigos deontológicos, mas que códigos? Podemos aqui falar de Códigos Deontológicos Profissionais? Claro que sim! Porque aqui se fala de Gestores, de empresas, de um aglomerado de profissionais que requerem um conjunto de regras e de procedimentos. Não é o simples facto da ética estar na moda que leva a que, cada vez mais as empresas adoptem comportamentos éticos, é que a Ética, o simples facto de existir um Código Deontológico adequado a cada tipo de profissionais não é suficiente para uma gesta eficiente e para ajudar a atingir os objectivos das organizações, das empresas e os objectivos individuais de cada profissional integrado numa entidade empresarial ou isolado. A falta de ética ou os actos contrários ao código de ética ou ao código deontológico podem ter efeito inverso ao que se pretende quando se adopta esse mesmo conjunto de princípios… a ética por si só não gera valor, mas a falta dela pode impedi que se gere valor.
Todos sabemos que a economia é sustentada por entidades empresariais, que cada uma destas entidades contribui com uma fatia dos proveitos do estado mas tudo isto só faz sentido quando há bons profissionais por detrás destas entidades, quando se actua, em todas as frentes, de forma ética, porque uma empresa é formada por um conjunto de profissionais de diferentes ramos e bastará que um desses profissionais viole o seu Código Deontológico para que a imagem da empresa em que está inserido seja afectada. Imagino, por exemplo, um TOC – falando um pouco sobre o nosso caso – que viola o princípio da confidencialidade, prestando informações a terceiros que possam por em causa procedimentos confidenciais da empresa a quem presta serviços, que confiança depositaria a empresa afectada em qualquer outro TOC que de futuro lhe fosse prestar serviço? Ficaríamos todos afectados porque é difícil recuperar a confiança quando esta é perdida. Ou um Gestor que, à luz do exemplo estudado no início do semestre com a Dra Elsa Barbosa, vem de uma empresa concorrente para outra empresa, trazendo da anterior informações confidenciais que, de forma fraudulenta e vêm ajudar a nova empresa a concorrer de forma vantajosa com a anterior… seria isso justo ou correcto? Legal? Será que algum de nós queria um destes gestores na nossa empresa?
Os princípios éticos, estejam eles ou não inscritos através de um Estatuto ou de um Código deontológico, mais não servem do que para tornar tudo mais claro, mais justo, mais legal. Que mais não seja, servem para que cada um de nós pense antes de agir, antes de tentar melindrar ou prejudicar o próximo, antes de copiar práticas e ideias, antes de receber honorários injustos, antes de aceitar um trabalho para o qual não reúne competências, etc.
Porque se, mesmo com todas as represálias éticas e morais a que estamos todos sujeitos ainda se verificam tantos casos como os que neste Blog foram comentados, se as não houvesse o mundo andaria do avesso e teríamos de ter muito mais cuidado com a própria sombra.
Antes de sermos profissionais, sejamos éticos em todas as nossas relações com terceiros, em todos os nossos actos e pensamentos… não é preciso estar escrito num código de ética ou num código deontológico que somos responsáveis pelos actos que praticamos para que nos tornemos efectivamente mais responsáveis… essa vontade deve partir do nosso interior e não de um código a que temos de nos submeter quando acabarmos o curso para entrar numa Ordem ou numa Câmara ou qualquer Associação…
Acima de tudo, sejamos Éticos, mais que nã seja para andarmos de consciência tranquila!
Cada vez se reflecte mais sobre o papel das empresas na nossa sociedade sendo dado um maior destaque, não somente sobre os aspectos económicos, mas também, como actores sociais. A actual crise de valores suscita discussões, que são o sintoma da falta de direcção. As inovações biomédicas, a corrupção da dignidade, o sistema económico exclusivista, são alguns dos muitos factores que nos fazem retomar os problemas centrais da ética: O que é bom? O que é justo? O que é moralmente aceitável? Qual o critério para emitir um juízo moral?.
Podemos simplesmente perguntar: Não se vive agora no tempo do “pragmatismo esclarecido”? Antes de tirarmos conclusões apressadas, talvez valha a pena começar por considerar a questão com seriedade. Veja-se o seguinte: Hoje, na opinião de grande maioria, a técnica e a ciências pertencem ao domínio público e são de interesse comum, enquanto que religião e moral, pelo contrário, presumivelmente pertenceriam apenas ao domínio do subjectivo.
Transportar estas questões para a actividade empresarial será sempre um risco, assim como o andar de avião ou a escolha de uma prato gourmet que não conhecemos, na medida em que nos poderemos reger precisamente por valores que nos são privados, pelas nossas morais. A ética não cresce de um momento para o outro, necessita ser alimentada pela empresa, assim como explicada e demonstrada aos colaboradores. Não vale a pena negar a existência de realidades que não se podem verificar no laboratório, até porque a existência das mesmas não depende do nosso reconhecimento relativo às mesmas. Será que tudo o que é tecnicamente possível, é moralmente aceite?
A promoção da ética requer investimentos para o fortalecimento institucional e modernização e o combate à corrupção, de forma a gerar resultados, assim como a reversão da sensação de impunidade que ainda subsiste na população. Assim, a gestão da ética tem por objectivo o estabelecimento de padrões éticos de conduta nas organizações capazes de não deixar lugar a dúvidas quanto à conduta esperada numa situação específica. As normas e regras estabelecidas numa organização empresarial explicitam-se num Código de Ética, o qual terá tanto maiores possibilidades de ser aceite quanto mais sustentado estiver nos seus princípios éticos. Até porque o código não é algo estático que se estabelece de uma vez por todas, assim como a vida social não o é. Ao longo do tempo são necessárias revisões e transformações direccionadas para os objectivos desejados.
Consequentemente, a organização cujos colaboradores desenvolvam o espírito ético e a sua prática rotineira, crescerá em conceito e terá o seu quotidiano modificado mediante a forma respeitosa de relacionamento humano, de dentro para fora, intrinsecamente, consistente e duradoura.
Isto explica porque nos países mais desenvolvidos não somente os governos, mas também os investidores, os consumidores e o público em geral apresentam exigências cada vez maiores sobre o desempenho da empresa, atribuindo valor - além do puro resultado económico - a aspectos como a qualidade, a imagem, reputação e a confiança na empresa em termos da Ética nos Negócios e da Responsabilidade Social e Ambiental. Noutras palavras, não se analisa somente o resultado económico-financeiro, mas também a maneira como foi obtido, avaliando e premiando as empresas que possuem as “melhores práticas” nas relações com os seus interlocutores públicos e privados, quer pela qualidade dos produtos e serviços, quer pela excelência no atendimento, quer pela transparência e rectidão de comportamento.
A reputação é o recurso mais importante para o sucesso da empresa e representa um “activo intangível” que agrega valor e é a base sustentável para o crescimento da empresa ao longo do tempo.
Paulo Amaro nº 4375
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