No pedido de autorização legislativa que o Governo dirigiu ao Parlamento relativamente à obrigação de comunicação de operações de planeamento fiscal vai implicar que os advogados tenham de renunciar ao sigilo profissional, segundo a imprensa desta sexta-feira (Jornal de Negócios e o Semanário Económico).
O documento entregue pelo Executivo na Assembleia da República não dá muitos pormenores além dos que já tinham sido anunciados pelo primeiro-ministro e pelo ministro das Finanças no Parlamento, uma vez que o advogados também intervêm na função de consultoria fiscal, os requisitos transparência em todo o processo.
Basicamente, a proposta do PS aponta a intenção de legislar no sentido de obrigar algumas operações de planeamento fiscal a serem previamente comunicadas.
De acordo com o Semanário Económico, a informação passará a ser obrigatória «sempre que estejam envolvidas entidades sujeitas a regimes fiscais privilegiados, bem como a estruturação de produtos ou veículos financeiros utilizados para fins de evasão ou planeamento fiscal agressivo».
No fundo a ideia do Governo visa evitar casos como os que deram origem à operação «Furacão», o maior processo de sempre de investigação que corre sobre a banca.
24-11-2006 9:02:28 in Diário Digital
http://diariodigital.sapo.pt/dinheiro_digital/news.asp?section_id=13&id_news=74311
Comentário
Na minha opinião, segundo este artigo, a ideia do Governo, será a diminuição da evasão fiscal. Do modo como esta noticia se apresenta penso que é uma forma eficaz para tal problema, visto este ser um problema grave no nosso país e com tendência para aumentar, mas por outro lado penso ser uma solução demasiado radical por parte do governo.
A evasão fiscal deve e tem que ser combatida, de forma a que haja consenso entre as varias partes envolvidas nesse processo.
O modo como o Governo está a querer abordar esta medida, talvez não seja a mais correcta éticamente, pois está a impor uma obrigação neste caso de comunicação de operações de planeamento fiscal o que vai implicar que os advogados tenham de renunciar ao sigilo profissional.
Se esta acção for avante o sigilo perdera toda a sua confiança em meu ver e não só neste meio como noutros, pois se o governo impor esta acção neste meio também poderá mais tarde faze-lo noutras áreas sem que nada nem ninguém lhes oponha.
Uma decisão desta dimensão não deverá ser tomada só pelo Governo, mas também por parte da nossa sociedade, nomeadamente advogados, juristas, tocs, entre outros, envolvidos nestes assuntos visto lhes dizer respeito.
É certo que existe uma grande fuga ao fisco mas nem toda a sociedade o pratica, essa parte da sociedade (grande parte, felizmente) não tem que pagar pelos erros das entidades que praticam.
De que serve assim a formação académica de um advogado e o seu código deontológico, que em termos de sigilo profissional se baseia nos seguintes artigos:
Do segredo profissional
Artigo 5.º
(Âmbito)
1. O segredo profissional é um direito e um dever fundamental do advogado que, no exercício da sua profissão, é depositário dos segredos e informações confidenciais dos seus clientes.
2. A obrigação de segredo profissional não está limitada no tempo.
3. O advogado deve exigir dos seus associados, empregados ou de qualquer pessoa que consigo colabore na prestação de serviços profissionais, a observância desse segredo profissional.
4. Nomeadamente o advogado é obrigado a segredo profissional no que respeita:
a) A factos referentes a assuntos profissionais que lhe tenham sido revelados pelo cliente ou por sua ordem ou conhecidos no exercício da profissão;
b) A factos que, em virtude de cargo desempenhado na Associação de Advogados, qualquer colega, obrigado quanto aos mesmos factos ao segredo profissional, lhe tenha comunicado;
c) A factos comunicados por co-autor, co-réu ou co-interessado do cliente ou pelo representante;
d) A factos de que a parte contrária do cliente ou respectivos representantes lho tenham dado conhecimento durante negociações para acordo amigável e que sejam relativos à pendência.
5. A obrigação do segredo profissional existe, quer o serviço solicitado ou cometido ao advogado envolva ou não representação judicial, quer deva ou não ser remunerado, quer o advogado haja ou não chegado a aceitar e a desempenhar a representação ou serviço, o mesmo acontecendo para todos os advogados que, directa ou indirectamente, tenham qualquer intervenção no serviço.
6. O segredo profissional abrange ainda documentos ou outras coisas que se relacionem, directa ou indirectamente, com os factos sujeitos a sigilo.
Artigo 6.º
(Sigilo e nulidade de prova)
1. Os advogados não podem ser inquiridos ou revelar factos que constituam segredo profissional e de que tiverem tido conhecimento no exercício das suas funções.
2. São nulas todas as provas obtidas através de declarações feitas pelo advogado com violação do segredo profissional.
Se esta transparência fiscal vier obrigar a romper o sigilo profissional, para alem da violação do seu código deontológico, como já foi referido, também se incorre na falta de credibilidade nos advogados que tratam destes serviços fiscais, isto pode levar a toda uma alteração nos princípios da advocacia/fiscalidade.
Esta atitude do Governo, de querer interferir na ética de uma profissão faz-me pensar que pode ser o princípio de alterações futuras nos códigos deontológicos e de ética noutras áreas.
São atitudes como esta, obrigar uma classe profissional a alterar os seus estatutos, que nos levam a pensar no que o governo esta a tomar medidas de um antigo regime.
Como é referido no artigo, “a ideia do Governo é evitar casos como os que deram origem à operação “furacão”, como é do conhecimento geral esta operação incidiu em investigações sobre a banca. A banca e outras grandes empresas talvez sejam as que tentam fugir ao fisco, o que não e ético, justo e pouco profissional da parte dela uma vez que quem acaba por ter de pagar com estas “ideias do Governo” são as pequenas e médias empresas.
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2 comentários:
O Sigilo, previsto no art. 81.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, é um dever deontológico fundamental, condição prática do exercício e da própria dignidade profissional de quem se dedica às Artes do Foro. No entanto, este pilar fundamental tem sofrido cada vez mais restrições, podendo mesmo ser posto em causa.
As alterações introduzidas pela Directiva 2001/97/CE do Parlamento e do Conselho da União Europeia de 4 de Dezembro de 2001 à Directiva 91/308/CEE do Conselho - relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais - poderão resultar, aquando da sua transposição para o direito interno (ou na sua falta...) no sacrifício do dever de sigilo profissional em nome do combate a este tipo de criminalidade.
Com esta alteração, o âmbito de aplicação da Directiva foi substancialmente alterado tanto a nível subjectivo, como objectivo.
“Primeiro, no âmbito subjectivo, passam a estar obrigadas a denunciar situações suspeitas, para além das Instituições de Crédito e das Instituições Financeiras, os Auditores, técnicos de contas externos e consultores fiscais, os agentes imobiliários, os negociantes de bens de valor igual ou superior a 15.000 €, os casinos, e, por último, os notários e outros profissionais forenses independentes, leia-se advogados, quando "participem" em determinadas actividades, como por exemplo, a venda de imóveis, de valores mobiliários, a abertura e gestão de contas bancárias, fundos e trusts.
Segundo, na vertente objectiva, a alteração ocorrida traduz-se no alargamento do conceito de actividade criminosa, que passou a incluir, para além do produto do crime associado aos estupefacientes, a fraude, a corrupção, e ainda qualquer infracção que possa gerar proveitos substanciais e que seja punível com uma pesada pena de prisão de acordo com o direito penal do Estado-membro, entre outros. E isto, sem prejuízo de os Estados-membros poderem incluir outras infracções no conceito de actividade criminosa.”(Barros, Sobral, G. Gomes e Associados)
A abordagem e o desenvolvimento do sigilo, para o efeito das alterações legislativas introduzidas, releva ainda pela obrigatoriedade de tomar em linha de conta as obrigações que passam a ser impostas aos profissionais forenses independentes, que, em consequência passam a estar obrigados a: identificar o cliente mediante documento comprovativo e, ou, o seu mandante no caso de este não estar a actuar por conta própria; a conservar os mesmos documentos por cinco anos após o termo das relações profissionais havidas, e ainda a informar, por iniciativa própria, quaisquer factos que possam constituir indícios de operações de branqueamento de capitais, facultando às autoridades responsáveis todas as informações necessárias a seu pedido.
Estas duas últimas obrigações consubstanciam um dever de denúncia, que, no entanto, pode ter como destinatário da informação a Ordem dos Advogados (O.A.), por força de determinação legislativa nacional.
A Directiva ressalva que os Estados-membros não estão obrigados a aplicar as obrigações supra referidas e contempladas no n.º1 do diploma a um conjunto de profissionais com ligações ao foro, nomeadamente aos notários, profissionais forenses independentes, auditores técnicos de contas externos, relativamente às "informações por eles obtidas sobre um dos seus clientes no processo de determinar a situação jurídica por conta do cliente ou no exercício da sua missão de defesa ou de representação desse cliente num processo judicial ou a respeito de um processo judicial, inclusivamente quando se trate de conselhos relativos à forma de instaurar ou evitar um processo judicial", independentemente do momento da obtenção da informação.
No entanto, esta ressalva não tem a mesma amplitude que o sigilo profissional, tal como definido no art. 81.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, já que este impõe ao Advogado o sigilo sobre quaisquer factos referentes a assuntos profissionais que tenha conhecimento no âmbito da sua profissão, não sendo relevante a existência de representação judicial ou extra-judicial.
Tendo em conta que a base da relação que se estabelece entre cliente e advogado é sem dúvida a confiança, urge questionar qual o sentido da existência de qualquer dever de denúncia. Até porque, o sigilo profissional nos moldes em que está definido legalmente só pode ser quebrado em casos excepcionais, depois de um parecer positivo da Ordem dos Advogados. Embora o Advogado seja um colaborador ao serviço do Direito e da Justiça, em primeira linha a sua função é a defesa dos interesses do seu cliente. O que, diga-se, é igualmente uma forma de cumprir esse desígnio.
Reconhecendo que os valores e interesses que a referida legislação comunitária procura salvaguardar, são, sem sombra de dúvida, muito importantes, não podemos concordar com a ideia de advogado denunciante, sob pena da própria dignidade profissional ser posta em causa. Ao que acresce, o facto da organização prática da profissão exigir o conhecimento da verdade dos factos, que poderá ficar prejudicado pelo receio que o cliente sentirá se tiver presente este novo dever de denúncia.
Deste modo, o dever de denúncia imposto faz repensar a perspectiva secular do advogado confidente, totalmente antagónica com a nova orientação que esta directiva preconiza.
Antevê-se assim, pelo menos, um cerco a nível europeu ao branqueamento de capitais e áreas com ele conexas, traduzindo esta Directiva uma manifestação da vontade comum dos Estados-membros em abrir "guerra" a este tipo de ilícitos. Para tal os Estados-membros contarão com a participação de todos os profissionais do foro, bem como da interligação e interacção com as polícias judiciárias e departamentos fiscais de modo a produzir frutos.
Todavia, é imperativo que tal vontade comum não deixe de respeitar os deveres éticos e deontológicos dos profissionais do foro que, como tal, gozam ainda de alguma excepcionalidade na quebra do seu dever de sigilo quando se trate de clientes e, ou, constituintes.
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